segunda-feira, 7 de março de 2011

Nunca mais amor


Ofegante, não conseguia dizer as palavras que lhe vinham a mente. E pensava em tantas coisas, sentia tantas coisas. Nenhuma palavra. Só um conjunto de vogais sussurradas, liberadas em berros e gemidos. Ali havia uma imensidão de tesão. Para eles, todo o sexo do mundo. 
Todos os dias mãos se pegando, olhos se cruzando, braços se apertando. Carinhos, afagos e vontade. Eram os corpos que não conseguiam se manter distantes, era o entorpercimento pela descoberta daquelas curvas, daquelas mãos, dos movimentos, do som que faziam juntos, do sabor do suor dele, da sensação de se sentir desejada em todos os seus músculos e gestos. 
Todos os dias risos, satisfação, cansaço, insaciedade. Em cada poro o prazer se dilatava, escorria em suor e exalava-se num perfume carnal. Olhos se encarando, bocas se beijando, mãos desbravando cada centímetro do corpo que lhe arrancava sorrisos. E o peito chacoalhava esperando o toque no lugar da pegada, a palavra no lugar do beijo, o aconchego no lugar dos apertos.
Todos os dias prazer, emoção, movimento, ritmo, embriaguez e corpos molhados no lençol amassado. E ela descobria a graça de curtir aquele minuto despretensiosamente. Se sentiu vulgar - e livre em sê-lo. Anunciou-se como tal, comportou-se como quis naquela cama, todos os dias.
Todos os dias, embasbacado, ele repetia: Te encontrei, me encontrei! Ela deixava ser vista assim, se fazia perceber assim, amando ser diferente do que sempre foi. E pensava quando o via: Descobri-o, descobri-me. 
Todos os dias um avanço, performática, abusada. sem limites. E se divertia em diverti-lo, abusando do poder de provocar, da condição de se entregar. Nunca sentiu que o corpo pudesse ser tão interessante.
Todos os dias atravessando madrugadas à gritos, galopando na vida em ritmos acelerados, falando em línguas que nunca falou, conhecendo lugares que nunca alcançou. Não dava tempo de pensar. Ela achava interessante manter tudo sempre novo, ele achava interessante ter sempre novidades. Sem racionalizar, sem 'afetualizar'. 
Todos os dias. Sem lembrar do antes, sem pensar no depois. Não por paixão, nada por afeto.
Todos os dias sexo. Nunca mais amor. 

Texto: Carina Mota

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Perfume

Ontem, após ter quebrado um frasco de perfume guardado há quatro anos, senti minha alma se libertando por entre os caquinhos de vidro.
Quebrei - para sempre - o nosso/meu amor. Nossa história virou um farelo cortante, espalhado no meio da estrada, onde as pessoas pisam sem sequer notar o que tocam com os pés.
E aquela última gota de perfume, guardada como minha última esperança, se esvaiu pelo ar, se dissipando no vento, perdendo essência, desimpregnando minha vida do seu cheiro.
Nunca mais terei o aroma que me deu, nunca mais votará a respirar a mulher que te fui um dia. 
Cacos de vidro não se remontam, assim como esse "nosso/seu" amor quebrado.

Texto: Carina Mota